sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Camões de Hermano Saraiva

Agora que os mares são etéreos,
Que a nau de navegar eu tenho à mão,
Eu quero iniciar com dedos céreos
A rota de uma nau cujo timão
E casco não criei de mil estéreos,
Que rápida e veloz não singra em vão,
Mas leva-nos, em ciclos por segundo,
O mar alto a singrar de um novo mundo.

No vídeo a festejar o dez de junho,
Eu vejo um lente ilustre lusitano,
Jurista, reportando no seu cunho,
Vibrando e declarando, puritano,
Estrofe que saiu do luso punho,
Sofrendo de saudade em solo insano,
Ao longe, a refletir na sua alma
A dor que o verso escrito enfim acalma.

O lente reportava um fato antigo,
Um feito relatado em prosa e verso,
De tantos que narrou o luso amigo,
No livro que doou ao universo,
Depois de percorrer chão inimigo
De terras dos que vivem em chão diverso
Da Áfria que aqui vemos de frente,
Da parte que só vê o sol nascente.

A obra, Os Lusíadas, presente,
No foco de apológico sonido,
Com toda apologia referente,
Levou-me a aguçar o meu sentido
Que estava só no ver, da alma ausente,
E fez-me a mim saltar já compelido
A ser um outro ser que por moções
Quisesse versejar como Camões.

Tomei da estante pronto um tomo novo,
Não feito nesta terra, luso feito,
Impresso para ir a todo povo
(Não sei se impresso foi do mesmo jeito),
E lendo, verso a verso, então me movo,
De volta a conferir com meu respeito,
De volta a conferir do lente a voz
Soando a matizar do Tejo a foz.

Não sei se de Setúbal, talvez do Tejo,
A praias que mostrava nuas eram,
Mas via semelhança que não vejo
No mar que de Cabral as naus romperam,
Há séculos pra ter no seu velejo
As terras que intactas lindas eram,
As terras, lindas, férteis, que pisaram
Os lusos que a fé aqui plantaram.

Minh'alma, transportada àquelas praias,
No solo pétreo via que mostrara
Imagem semelhante de outras raias,
Por onde o nobre luso vagueara,
Lutando a desviar-se de outras saias,
Pra ser fiel à sua amada rara,
Deixada tão distante em pátria terra,
Que a muitos na armada sós desterra.

Camões, oh!, mais ilustre lusitano
Das letras, venerado além dos mares,
De lá, daqui, de lá, do oceano
Que corta os continentes postulares,
Em partes de um outrora solo mano,
Banhado não de água mas dos ares,
D'Atlântida imersa sob as ilhas
Que feitas foi então da pátria filhas.

Camões, oh!, mais ilustre na su' arte,
Cantado por quem tanto o enobreceu,
Nos livros que também em toda parte
São lidos porque, luso, o escreveu,
Eu quero nestes versos confessar-te
Que tenho o teu verso como meu.
E louvo a Hermano de Saraiva
Eu, nato brasileiro que é de Paiva.

Loures de Paiva
10.06.2003

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